“Sabes Ana, se pudesse mudava quase tudo no meu corpo. 

Não gosto de nada em mim. Nada. 

Já reparaste? Sou tão baixa e magra.

Nem tenho formas de rapariga. 

As minhas amigas não são como eu”

Bruna, 14 anos

É durante a adolescência que construímos a nossa identidade, em que nos descobrimos, a nós e aos outros. É uma fase em que a nossa autonomia aumenta, bem como a capacidade de tomar decisões e fazer escolhas e, neste cenário, podem advir desta etapa grandes desafios. 

Este é também um período durante o qual ocorrem muitas transformações em simultâneo – biológicas, psicológicas e sociais – e lidar com todas estas mudanças nem sempre é fácil. Alguns jovens sentem-se perdidos e até confrontados pelas inúmeras alterações (internas e externas), para as quais, nem sempre, se sentem preparados e, com as quais, muitas vezes não se identificam: 

“Por vezes não reconheço o meu corpo. Parece que isto não é meu, que não me pertence. De repente isto ficou assim, enorme. As minhas amigas não são assim. Eu já pareço a minha mãe. Entendes?”  

Francisca, 13 anos

Relatos como os da Bruna e da Francisca são cada vez mais comuns e poderão ter um enorme impacto no seu “eu” futuro: uma autoimagem negativa durante a fase da adolescência contribui para uma baixa autoestima e terá consequências em idade adulta. 

Um adolescente que se sente frequentemente desconfortável ou insatisfeito com o seu corpo pode, por exemplo, isolar-se, ter dificuldade em comunicar, sentir tristeza, irritabilidade, vergonha, culpa, frustração, ser demasiado autocrítico ou até praticar atividade física em excesso “de forma obsessiva”. Tudo isto irá causar o chamado sofrimento psicológico, que, por um lado, influenciará a forma como viverá a etapa seguinte – a fase adulta – e, por outro, poderá durante a juventude aumentar o risco para a doença mental (como por exemplo, perturbações de ansiedade, depressão, comportamentos auto lesivos, perturbações do comportamento alimentar, comportamentos aditivos, etc). Devemos, por isso, estar atentos aos sinais de alerta. 

Quando pensamos nesta temática, principalmente durante a adolescência ou no início da vida adulta, devemos igualmente refletir sobre a influência que a sociedade e meio envolvente poderão ter nesta fase. A verdade é que a comunidade em que os jovens estão inseridos, pode, por vezes, julgar de forma bastante cruel o que considera diferente da maioria. E esta estigmatização,  pode “deixar pouco espaço” para a autenticidade e criação da identidade, porque impõe à partida o papel que o jovem deve desempenhar, a imagem que deve ter, como se deve vestir, assim como os comportamentos apropriados para ter sucesso na etapa seguinte – o tornar-se adulto – criando ainda mais desafios aos adolescentes, que têm muitas vezes impacto a nível psicológico e comportamental.

Estes desafios, nunca foram tão visíveis como nos dias de hoje: os nossos jovens vivem numa constante pressão para atingirem padrões de beleza, muitas vezes difíceis de alcançar, com os quais são constantemente bombardeados. Seja nas redes socias ou nos media em geral, a tal beleza que “consumimos” está, com muita frequência, “filtrada”. No entanto, está ali, enchendo os olhos de todos – e aqui, sem filtros.

É verdade que não gostamos todos os dias da nossa imagem e os nossos jovens não têm que ser exceção. No entanto, é quando existe uma persistência desta visão negativa relativa à imagem, quando aparecem comparações constantes e de inferioridade, que isto se torna um problema. E, infelizmente, é cada vez mais comum os jovens dizerem-nos que “não gostam de nada na sua imagem”. Mas o problema não está, obviamente nestes jovens, mas sim nos padrões em que se baseiam e naquilo que valorizam. E é aqui, que muito trabalho deve ser feito, por todos e em equipa

A começar pelos pais. Como adultos de referência para os seus filhos, devem ter em consideração que aquilo que dizem e que decidem valorizar está a ser ouvido e apreendido pelos filhos. Devem por isso ponderar bem, nas críticas e autocríticas, aquilo que optam por valorizar ou desvalorizar. Os vossos filhos estão a ouvir e a aprender. E vão interiorizar e replicar aquilo que vocês realçarem.  

Entre pais e filhos, é muito importante que se criem vínculos seguros, relações que sejam sentidas como “proteção”,  com uma comunicação que seja aberta e sincera e que sejam um modelo positivo para os jovens.   

Ajudemos os nossos “miúdos graúdos” a valorizar a imagem que refletem ao espelho, mas a valorizar, ainda mais, o que está para além dele. 

Nota: Os nomes incluídos neste artigo são fictícios, as histórias são reais

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