Uma das competências-chave em que gosto de me focar com os meus clientes é a capacidade de recuperar rapidamente da adversidade. Há por aí muitas sugestões, desde o exercício físico até ao hábito de adoptarmos um discurso interno positivo, o chamado ‘positive self talk”. Mas qual delas é a melhor para mim? Não sei quanto a ti, mas a quantidade de sugestões, listas e recomendações que variam entre 3 e 10 passos deixam-me um pouco perdida.
Durante o confinamento, lembrei-me disto com uma situação que vivi com a minha filha de 13 anos. A tele-escola e a obrigatoriedade de assistir às aulas entre as 8h30 e as 15h30, estavam a desgastá-la. A sua escola tinha-lhe dado uma lista de dicas úteis sobre o que fazer, mas, na verdade, essa lista não ajudou, antes pelo contrário, fê-la procrastinar. Qual delas era a ideal? Quais seria ela capaz de fazer? Quando me disse como se sentia, percebi que também eu estava a cometer o mesmo erro: quanto mais opções de escolha ela tinha, mais sobrecarregada e desgastada se sentia, acabando por não optar por nenhuma.
Quais são as tuas estratégias de resiliência?
É uma pergunta que faço regularmente quando discuto estratégias para lidar com o stress que trabalhar com, ou gerir, equipas ou clientes multiculturais pode originar. Muitas vezes, a resposta que recebo do outro lado, demonstra alguma surpresa ou admiração com a minha pergunta. Como assim? O que é que isso tem a ver com competências culturais? ‘Tudo’, é invariavelmente a minha resposta. Explico-vos porquê.
O ambiente em que crescemos influencia a forma como olhamos para a realidade, o modus operandi à nossa volta, a nossa ‘normalidade’ na escola e na família até à universidade e ao trabalho. O nosso cérebro gosta de criar o maior número de atalhos possíveis de forma a poupar energia e reforçar os circuitos frequentemente utilizados. Segundo o vencedor do Prémio Nobel da Economia e autor do Livro “Thinking fast and slow” (Pensar rápido e devagar), Danny Kahneman, nós, humanos, somos governados pelo nosso “sistema cognitivo preguiçoso”.
Isto significa que os mapas mentais ou estratégias que aprendemos a utilizar, por exemplo, o que é que a ‘confiança’ significa para nós, são influenciados pelo nosso ‘ panorama cultural’ e é este que nos permite agir mais rapidamente, de forma quase automática, utilizando menos energia. Mas quando alguém nos faz algo que vemos como errado ou que está fora do nosso ‘panorama cultural’, isso desencadeia imediatamente os nossos alarmes internos e activa a função primária do nosso cérebro, o chamado mode de sobrevivência.
O problema do modo de sobrevivência é que diminui o fluxo de sangue que e bombeado para o nosso cérebro “executivo”, o que influencia aspetos como o pensamento crítico, a criatividade e a empatia. Esta espécie de ‘modo de voo’ em que o nosso cérebro entra quando estamos em situações de perigo é vital para nós, no sentido literal do termo. No entanto, quando estamos a tentar colaborar com um elemento da nossa equipa com o objetivo de alcançar um determinado objetivo, este modo de sobrevivência pode tornar-se muito contraproducente.
E se é verdade que é possível “apreender um novo panorama cultural”, pode levar meses para que este seja codificado no hipocampus, o que está longe de ser o ideal quando temos prazos de uma ou duas semanas para cumprir, como não raramente acontece no mundo do trabalho. Visto que aprenderes a compreender um novo panorama percetual sobre o que é a confiança para o outro ou perceber como o outro interpreta o teu feedback negativo não acontecerá do dia para a noite, como podes ajudar-te a ti mesmo nesta fase de adaptação stressante?
Eu pedi à minha filha para me falar de um momento no seu passado em que ela tivesse ultrapassado uma situação stressante. O que é que fizeste para a ultrapassar? O que correu bem? O que não funcionou? Ela parou durante alguns segundos. De repente, lembrou-se da fase de exames, quando estava na sua antiga escola, em Itália. Contou-me como a música a ajudou a lidar com o stress, seja tocando guitarra ou apenas ouvindo.
Olhar para trás no tempo pode ajudar-nos a identificar momentos em que demonstrámos uma resiliência que pensávamos não ter, momentos que muitas vezes já esquecemos ou aos quais não reconhecemos o devido significado. Muitas vezes não nos apercebemos dos recursos que já temos dentro de nós, que ganhamos inevitavelmente, pelas circunstâncias que a vida nos apresenta: muito poucos de nós conseguem passar pela vida sem ter que lidar com algum tipo de adversidade. Tirar partido desse ‘atalho positivo’ – no caso da minha filha foi tocar guitarra – requer menos esforço do que ir procurar novas formas de conseguirmos ser resilientes e permite que o nosso cérebro se concentre no novo desafio a enfrentar.
Num período de extraordinário stress como aquele que vivemos nos dias de hoje, somos bombardeados com listas e listas intermináveis, com dicas sobre as melhores práticas para ultrapassar a ansiedade, ser resilientes e assim por diante. A verdade é que recebemos uma quantidade de informação tão elevada, que estamos constantemente em sobrecarga, não a conseguindo muitas vezes processar, o que torna com que seja difícil decidir por qual optar. Por vezes, quando estamos num estado mental negativo, em que não conseguimos ser produtivos, pode parecer mais fácil para o nosso cérebro simplesmente adoptar uma postura passiva e, não escolher nenhuma das opções, do que ter uma abordagem pró-activa, que implique mudança e, portanto, desconforto.
Assim, não há fórmulas mágicas, mas muitas vezes não é necessário viver esse desconforto da procura por uma nova opção, podemos encontrar no passado respostas para o presente:
Para um momento…respira fundo… pensa no que funcionou contigo no passado. Algo com que estás familiarizado, uma prática que não é nova, que não requer esforço ou de 30 dias de aplicação diária para conseguires ver os efeitos desejados. Se conseguires identificar essa prática, só irás precisar de recarregar e reativar esse ‘atalho’ que já conheces, para seres mais resiliente.