Começámos há cerca de 250 mil anos a dormir nas cavernas, ou seja, estamos biologicamente preparados para dormir quando o sol nasce e para nos deitarmos quando o sol se põe.
Com a evolução da sociedade, a mãe deixou de ter um papel apenas focado nas lides domésticas, e começou também ela a ter um papel ativo enquanto trabalhadora, à semelhança da figura paterna. E, uma vez que o sono faz parte do desenvolvimento de qualquer ser humano, tal como andar, comer e falar, é cada vez mais indispensável que se criem estratégias para melhorar a gestão do sono de todos os elementos da família.
Quando olhamos mais especificamente para o sono da criança, vemos que estas, ao contrário dos adultos, não têm padrões de sono definidos, nem fazem distinção entre dia e noite. E porque será que as crianças acordam muito mais vezes à noite do que os adultos? Isto acontece porque as crianças têm um ritmo de sono diferente. Essencialmente existem 2 fases de sono na criança: um mais ativo, que também é mais leve (que vai dar origem ao designado sono REM), e depois um sono mais profundo (sono não REM). É por este motivo que, quando as crianças adormecem em sono ativo (mais leve), muitas vezes vemos o cenário de chuchar no dedo, rir ou movimentar muito os olhos, uma vez que nesta fase ainda estão no sono ativo. Por oposição, o sono dos adultos é monofásico, ou seja, existe um longo período de sono, por exemplo, dormir 7 horas “seguidas” por noite.
“Então e o teu filho passa bem as boas noites?”
Quantos pais não ouviram já esta típica frase em conversas com casais amigos? A verdade é que os pais têm uma série de tarefas no seu dia a dia e as flutuações do sono dos filhos vão naturalmente ter impacto no seu bem-estar e na possibilidade de desenvolverem privação do sono. Quando esta ocorre, há um sono fragmentado por parte dos pais, que não dormem o número suficiente de horas, o que pode ter várias consequências na sua vida, que vão desde: fragilidade na coordenação motora, fadiga, irracionalidade emocional ou falta de concentração. Nestes casos, cresce o risco de desenvolvimento de doenças como a obesidade ou o AVC.
Um estudo da Oxford University e da Sleep Research Society, concluiu que 6 anos depois da privação do sono dos filhos, o sono dos pais não melhorou, verificando-se que as mães dormiam aproximadamente menos 20 minutos do que antes e os pais menos 15 minutos. Demonstrou-se ainda que ter um filho aumenta em 50% a probabilidade do sono dos pais piorar
Qual é a importância do sono nas várias fases da vida?
É certo que não dormimos sempre da mesma maneira. Enquanto bebés dormimos muito, quando somos crianças somos mais matutinos, depois, por volta da adolescência, levemente mais notívagos. Por sua vez, os idosos, por terem um sono com muitas interrupções, realizam pequenas sestas ao longo do dia. Tudo isto é consequência de determinadas alterações fisiológicas, havendo uma tendência, com a idade, para dormirmos menos e nos tornarmos pessoas mais matutinas. Ainda assim, é importante percebermos que estamos sempre a falar no campo das probabilidades, e que por vezes isto pode não acontecer.
Há ainda uma ligação entre o sono e as emoções, relacionada com as alterações que vamos sentido ao longo do nosso desenvolvimento. É por isso que muitas vezes somos autênticas rochas durante uma determinada fase da vida e noutras estamos constantemente a acordar. Mas na maior parte das vezes estas variações são encaradas com muito espanto, porque na verdade, infelizmente, nunca fomos verdadeiramente educados para o sono.
Numa sondagem realizada na página de Instagram “O teu mal é sono”, apenas 2% dos inquiridos, afirmaram ter sido educados para as questões do sono. A verdade é que somos educados para a prática de exercício físico, para a prática de uma alimentação saudável, para o não consumo de drogas ou álcool, mas ainda há um grande desconhecimento em matérias do sono. Ao mesmo tempo, os jovens e adolescentes, vêm-se cada vez mais cedo envolvidos em atividades que comprometem o mesmo, como o uso excessivo das redes sociais ou dos jogos online.
“Sono Escolas” – Educar para o Sono
O projeto “Sono Escolas”, coordenado pelo Centro do Sono e pelas Professoras Teresa Paiva, Helena Rebelo Pinto e Teresa Rebelo Pinto, surge para fazer face a um problema relatado em várias escolas e professores, que chamaram a atenção para a existência de alunos com maus hábitos de sono.
Com o principal objetivo de educar para o sono, desenvolveram-se, então, vários materiais pedagógicos e científicos. Porém, como não chega saber “de cor e salteado” as regras de higiene do sono, este projeto pretende também trabalhar a vertente motivacional, isto é, perceber o que motiva cada um a mudar os seus hábitos para hábitos mais saudáveis, identificado as emoções e os sentimentos em relação ao sono.
O próximo objetivo passa por incluir o programa do “Sono Escolas” no currículo escolar, incentivando as crianças a educar os próprios pais para o que aprendem na escola.
Sestas são obrigatórias? Até que idade?
Outro aspeto muito importante no que toca ao sono na infância são as sestas: estas são obrigatórias até aos 3 anos, devendo ser uma prática diária. Contudo, não nos podemos esquecer que as crianças são diferentes umas das outras, e também os seus padrões de sono podem variar. Ainda assim, há sempre uma média pelo qual nos podemos regular e que é indicadora do que pode ser um número de horas padrão para cada faixa etária.
Caso prático: o que devemos ter em atenção?
Imagine uma criança de 5 anos que acorda muito a meio da noite. O que devemos fazer?
Em primeiro lugar, deve procurar saber, qual é o sono padrão de uma criança de 5 anos (pode guiar-se por aqui)?
Depois deve ter em consideração qual o contexto desse despertar? Acorda sempre à mesma hora ou acorda a horas diferentes com um motivo específico (ex: para ir ao wc ou porque tem pesadelos)
Terceiro, deve tentar perceber como é que, como pai ou cuidador, está a lidar com estes despertares? Desvaloriza o acontecimento, assumindo que é um problema irreversível? Ou fica demasiado zangado ou stressado?
O ideal para reconduzir ao sono é não dramatizar o despertar, adoptando uma postura calma, mas sem desvalorizar! Por outras palavras, se o seu filho acorda, seguramente o faz por um motivo, seja ele qual for! Tente perceber qual é. Pode ser por exemplo, algo simples, como uma sensação de angústia de separação dos pais, sentindo a necessidade de verificar se os mesmos não desapareceram. Caso não perceba o que é, deve recorrer a um psicólogo do sono.
Por fim, é indispensável que analise a sua relação com o sono, com base no conhecimento científico produzido por quem trabalha na área, distinguindo o que é normal do que é patológico, o que é típico da idade do que é um sinal de alerta de que deve procurar ajuda especializada para o seu filho.